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Curso técnico em Meteorologia forma primeiro aluno com autismo

ENSINO Data de Publicação: 02 abr 2018 08:19 Data de Atualização: 06 abr 2018 13:59

Talvez quem chegue ao fim de um curso preocupado apenas com provas e notas, nem sequer lembre que, para algumas pessoas, formar-se em qualquer nível pode ser um roteiro de superação diária. Lucas Pivetta, 23 anos, agora técnico em Meteorologia formado em março pelo Câmpus Florianópolis, só não desistiu dos estudos por muita força de vontade e incentivo da família. Diagnosticado com Síndrome de Asperger por volta dos 20 anos, Lucas conta que entender-se trouxe a ele uma nova experiência.

A Síndrome de Asperger faz parte do Transtorno do Espectro Autista (TEA), e Lucas foi o primeiro aluno de um curso técnico subsequente diagnosticado com o TEA a se formar no Câmpus Florianópolis. Nesta segunda, dia 2 de abril, é comemorado o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo. Tradicionalmente, as celebrações para que mais pessoas saibam sobre o transtorno incluem caminhadas, palestras, atividades, iluminação em azul de monumentos públicos e pessoas usando a cor azul – escolhida pela maior incidência do autismo em meninos do que em meninas. Saiba mais clicando aqui

Tristeza e choro na escola

A família de Lucas é de Ibicaré, Meio Oeste catarinense. Segundo a irmã mais velha, Rafaéla Pivetta, Lucas sempre teve dificuldades na escola. A adaptação às aulas era difícil e fazer amigos, mais ainda. “Quando voltava da aula, ele voltava triste e chorava porque sofria muito. Os colegas tiravam sarro, xingavam, ele não conseguia jogar futebol (crianças dentro do espectro autista costumam ter dificuldades de coordenação motora).Ele chorava muito também porque tinha umas primas e primos da idade dele de quem ele gostava bastante, mas eles não queriam brincar com o Lucas”, relembra. “Ele não queria ficar em sala. Durante um ano, no pré, nossa mãe teve que ficar nas aulas, para que ele continuasse estudando”.

Lucas, por sua vez, conta que nunca se sentiu diferente, mas era muito difícil se concentrar nas aulas e, muitas vezes, a forma utilizada pelos professores para explicar as matérias não era compreensível para ele. E ele sentia a hostilidade dos 'coleguinhas'. Pela dificuldade em focar nos estudos, o técnico em meteorologia recebeu, primeiro, um diagnóstico de Déficit de Atenção.

Bullying e depressão

Mas foi no Ensino Médio que as coisas pioraram. O bullying sofrido por Lucas o levou a uma depressão profunda, que durou muitos meses. “Quase tirei a minha vida. Se não fosse a minha família, eu não sei o que poderia ter acontecido”, relembra. Após o tratamento e o diagnóstico de Asperger, com terapia e medicação, Lucas pode focar numa paixão descoberta por volta dos nove anos: a Meteorologia. 

A paixão pelo clima

“Eu perguntava aos meus 'nonos' sobre o clima do passado, como o tempo se comportava. Aí eu acompanhei o Furacão Catarina e fiquei ainda mais apaixonado, uma paixão que foi evoluindo. Eu entrava na página do Climatempo, assistia a vídeos do Youtube sobre o assunto”, relembra. “Quando eu entrei, já sabia alguns conceitos. Professores e até minha família me questionavam se era isso mesmo que eu queria e sim, era”.

A professora Márcia Fuentes, do curso técnico em Meteorologia, conta que realmente o que facilitou muito a adaptação de Lucas às aulas no IFSC foi o fato dele ter vocação. “Ele gosta muito da área e se ambientou facilmente. Jargões e técnicas que eram difíceis para os demais alunos, ele já sabia e dominava”. 

Tanto para Márcia quanto para Lucas, a maior dificuldade dele no curso foram as apresentações e seminários. “Para mim, é muito difícil a discussão com os colegas, uma das maiores dificuldades que tenho é a comunicação”, explica o técnico. Outro desafio foi a autonomia: seguir tarefas e rotinas era um pouco complicado, pois Lucas ficava angustiado. “Mas percebemos que se fizéssemos um roteiro, ele conseguia seguir perfeitamente e realizar tudo o que era necessário”, diz a professora. 

Carinho e amizade

E fazer amigos, seguiu sendo um problema? Com um sorriso, Lucas disse que nunca viveu uma experiência igual: “Meus colegas do IFSC são totalmente diferentes. São mais calmos, mais amigáveis. Todo mundo se respeita”. Já Márcia lembra que a postura de Lucas, demonstrando orgulho de ser do jeito que é também ajudou bastante. “Nós valorizávamos sempre cada desafio superado, cada objetivo que ele cumpria”. Emocionada, a professora completa: “Acho que foi uma experiência muito gratificante, de perceber que a diferença não impede nada. E também pelo nível de interação a que chegamos, de muito carinho, compreensão e ajuda mútua”.

Como pretende cursar a graduação em Meteorologia mas não conseguiu passar na seleção para a UFSC ainda, Lucas não quis ficar parado e segue estudando no IFSC, no curso técnico em Meio Ambiente. “Vou continuar tentando, fazendo o Enem até passar”. E todos os dias ele passa na sala de Márcia para discutir sobre o tempo e previsões climáticas. “Agradeço aos professores do curso por tudo o que me ensinaram. Eu cheguei a pensar em desistir uma época, e eles não me deixaram. Os professores do curso técnico em Meteorologia são meu maior exemplo de vida. No começo, eu não acreditava que era possível, mas me formei e cheguei aqui”.

E o primeiro Asperger técnico em Meteorologia do Câmpus Florianópolis deixa um recado: “Eu entrei aqui no IFSC porque era um sonho que eu queria realizar e se vocês também quiserem realizar o sonho de vocês, não desistam, principalmente quem tem Síndrome de Down, ou de Asperger, ou tenham dificuldade de locomoção. Não desistam dos seus sonhos. Eu sei que um dia vocês vão conseguir se formar. Eu sei disso, de certeza, de todo o meu coração. Se eu consegui me formar, eu tenho certeza de vocês também conseguem”. 

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