JIFSC 2023 é o primeiro a receber estudantes trans

JIFSC Data de Publicação: 04 ago 2023 18:51 Data de Atualização: 06 ago 2023 11:01

A escola é um espaço em que se aprende e se pratica a inclusão. E assim também precisam ser os jogos escolares, nos quais todos estudantes têm o direito à participação. A partir desses preceitos, a Comissão Organizadora do JIFSC registrou, neste ano, as primeiras inscrições oficiais de estudantes trans na etapa estadual dos Jogos. Sofia Pineda Fajardo, de 15 anos, e Viktor Fernandes Sttocco, de 16 anos, representaram respectivamente as cidades de Garopaba e Caçador.

Viktor

Cursando o primeiro ano do ensino médio técnico em Informática, Viktor disputou o tênis de mesa individual e em dupla. A paixão pelo esporte, segundo ele, foi a motivação para se dedicar dentro e fora do Instituto, ainda que nem sempre encontrasse condições confortáveis para praticar. “No local que treino fora do câmpus, alguns homens dizem que não jogam comigo porque sou ‘mulher’ e que, por isso, sou fraco”, relata.

Dentro do câmpus, Viktor pratica esportes com meninos e meninas. Nas aulas de educação física não há separação da turma. “Aqui eu encontro respeito, que é o mínimo que se espera das pessoas. Me sinto mais aberto, mais incluído, mesmo que ainda haja problemas”, afirma.

No JIFSC, porém, nem tudo está pronto para a inclusão. Ao precisar tomar banho após o primeiro dia do evento, Viktor percebeu que os chuveiros do vestiário masculino possuíam apenas divisória lateral, mas que não davam privacidade. “Por isso estou sem tomar banho ainda [ao final do primeiro dia]. Alguns amigos até sugeriram tentar o banheiro feminino, mas a situação é a mesma”, lamenta Viktor. Após a conversa com a equipe de Jornalismo, a Comissão Organizadora foi informada do problema e procurou o estudante para resolver a situação.

Mesmo com percalços, a vontade de participar do JIFSC era muito grande. Além de competir, o estudante de Caçador espera que a sua participação no evento estadual incentive outros estudantes trans a se dedicarem e participarem das práticas esportivas dentro e fora da escola. “Tem gente que fala que isso é só militância, mas é um sentimento humano. Cada coração transborda diferente”, aponta.

Sofia

Atualmente no primeiro ano do ensino médio técnico em Administração, Sofia também veio ao JIFSC para abrir portas a mais estudantes trans. “Isso é 80% da minha motivação de estar aqui. Há também a vontade de participar, mas principalmente de dar visibilidade e exemplo para mais pessoas”, conta.

Como não há pista de atletismo no Câmpus Garopaba, boa parte do treino da aluna ocorre em situações do cotidiano. “Estou sempre correndo para pegar o ônibus, para chegar na sala de aula, essas coisas. Corro pra não me atrasar e acabo criando resistência”, brinca.

Em relação ao evento, Sofia tem sentido o cansaço, tanto na pista de atletismo quanto na arquibancada. Além de ganhar a medalha de ouro nos 3.000 metros e a medalha de prata nos 1.500 metros, ela também ficou quase sem voz devido à torcida para os colegas. “Dizem que sou a torcedora mais empolgada!”, comenta.

Mas seu foco, nos Jogos, está em servir de exemplo para mais estudantes trans. “Aqui estamos participando de um evento escolar, não de uma competição de alto desempenho. Eu me preparei para sofrer questionamentos por parte de outros alunos, mas felizmente não houve nenhuma situação complicada”, comemora.

Organização do evento

As inscrições de estudantes trans chegaram à comissão organizadora do evento e foram prontamente aceitas. “Entendemos que são jogos escolares, de modo que não era uma possibilidade a negação da inscrição de um estudante por qualquer questão como gênero, etnia ou outra. Todos que se habilitaram nas etapas seletivas tiveram direito à participação”, destaca Diogo Moreno, coordenador de Juventudes e Diversidades dentro da Pró-reitoria de Ensino do IFSC.

Para se preparar para o evento com a participação inédita de atletas trans, a comissão organizadora preocupou-se em adequar Código de Disciplina Esportiva para evitar situações vexatórias. “Criamos, assim, o artigo 28, que tornou infração passível de punição qualquer manifestação preconceituosa, como misoginia, machismo, lgbtfobia, xenofobia, entre outras”, lembra Diogo.

De acordo com o coordenador da Comissão Organizadora do JIFSC, Mozart Maragno, o debate sobre a participação de estudantes trans na competição chegaria mais cedo ou mais tarde, e foi tratado no grupo organizador por meio da perspectiva institucional da inclusão. “Esse é um debate em movimento na sociedade e sabemos que cada modalidade esportiva tem uma visão específica. Mas neste momento nossa preocupação foi garantir a realização de um evento inclusivo e com respeito às diferenças”, resume.

Neste sentido, Diogo lembra ainda que o JIFSC, além de contribuir para a qualidade de vida dos estudantes, também ajuda a promover a inclusão social. “Não há dúvidas de que a prática esportiva colabora na construção de um mundo melhor, por isso a relevância de termos um evento inclusivo numa perspectiva ampla e diversa, acolhendo a singularidade de cada estudante, oferecendo o apoio necessário a cada um e estímulo frequente do respeito às singularidades humanas, gerando um reflexo positivo para os estudantes enquanto cidadãos e para os próprios servidores do IFSC”, completa.

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