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Mulheres do La Feniére: as francesas e a do IFSC

ENSINO Data de Publicação: 29 jan 2019 10:17 Data de Atualização: 30 jan 2019 13:32

O sistema era simples. Uma lista de papel com os nomes de todos os restaurantes franceses com quem poderia entrar em contato e as respostas. L’Essentiel, La Maison Dans Le Parc, Les Rosiers, entre outros. A oportunidade de trabalhar com chefs mulheres seria seu critério. Mandou currículo e carta de intenção explicando o que queria aprender e enumerando os porquês de achar o restaurante interessante e compatível com a sua visão de gastronomia. Dois responderam. Um disse: não há vagas. Não coube no Yam Tcha, foi recebida no Auberge La Feniére Restaurant-Hôtel

“Queria muito ter a experiência de conhecer a gastronomia e de trabalhar em um restaurante no exterior. Eu gostava muito do idioma, da organização da cozinha na França e tinha vontade de conhecer a cultura dos franceses com a gastronomia, vista como uma arte para ser apreciada. Quando chegou a hora do estágio obrigatório, eu pensei: vou mandar. O máximo que pode acontecer é ninguém me responder”, diz Bianca Mahatma, aluna da 6ª fase do curso superior de Tecnologia em Gastronomia do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC).  

A possibilidade se transformou em resposta que virou realidade e riu na cara do pensamento “que fica na cabeça de que é difícil um lugar na França te aceitar”. Para resolver a burocracia teve ajuda do Setor de Estágios do IFSC e o francês, que a desanimou nos primeiros semestres por ser “um idioma complicado”, estudou com cursos oferecidos pela instituição, aula particular e por conta própria. 

Então, foi passar dois meses em Cadenet, cidade rural, com muitos produtores, daquelas para onde as pessoas vão ficar com a família e tentar garantir uma velhice tranquila. Quando soube que o Auberge La Feniére Restaurant-Hôtel era comandado por duas chefs, Bianca achou que deu sorte. 

A palavra final é das mulheres Sammut

Mais tarde descobriria que a história do lugar sempre foi marcada por mulheres. Uma das chefs, Reine Sammut começou a estudar as receitas da sogra, fundadora do Auberge La Feniére, e mais tarde assumiu a cozinha. 

Chef desde 1975, vinte anos depois de começar na profissão, Reine conquistou uma estrela Michelin, do guia de mesmo nome que premia os melhores hotéis e restaurantes do mundo. A profissão que aprendeu com a sogra, ensinou à filha Nádia, e são as duas mulheres Sammut que administram a cozinha. O terceiro chef é marido de Nádia, mas a palavra final era sempre delas. 

“Trabalhei com outras estagiárias mulheres e a sommelier, responsável pelos vinhos, era uma mulher de menos de 25 anos, a chefe do salão e do serviço, uma de 21. Tive bons exemplos. Eram todas muito boas no que faziam e bastante inspiradoras. Elas se impõem, sabem do que estão falando e sabem da posição delas”, conta. 

Com a equipe do restaurante, Bianca aprendeu o dia-a-dia da profissão entre setembro e novembro de 2018, ajudando na cozinha, a organizar e a limpar e às vezes participando do serviço. “A hierarquia na cozinha é bem rigorosa, cada um cumpre a sua função. Aqui no Brasil as pessoas meio que fazem um pouco de tudo e na França era bem dividido por praça, tinha chef, subchef, chef de sobremesa e os estagiários, e todos tinham funções bem definidas”, explica. 

Na cidade-família, um rosto familiar

De um café na Lagoa da Conceição, onde mora com a avó Maria de 95 anos, Bianca conta que sente falta dos cafés, padarias e confeitarias franceses. “De ir num lugar e ter uma coisa de boa qualidade que não é cara e você sabe que vai estar gostoso. Comi num restaurantezinho japonês muito bom e barato e era tipo esses lugares de X-Salada no Brasil. Mesmo o mais simples era muito bem feito.” Estômago satisfeito, cérebro cansado. Se esforçar o tempo todo para compreender a língua que não era a sua materna, cansava. Mas para driblar o desafio linguístico, Bianca teve uma ajuda. 

“Como chamaram ela, eu mandei para o mesmo lugar e me chamaram também. O lugar era isolado, um monte de cidades pequeninhas, e a gente trabalhava bastante. Ter uma pessoa junto foi muito bom”, quem diz é Rafael Reichert Alfaro, também aluno de Gastronomia do IFSC, e namorado de Bianca. 

Os dois se conheceram na faculdade e foram juntos para a França. Rafael podia ter sido engenheiro, podia ter ficado estudando em São Paulo, onde morou, mas viu que queria mesmo era estudar gastronomia e seguir o interesse despertado pelos pais, que cozinhavam em casa e sempre viam programas de culinária. Veio para Florianópolis, mas sem saber se daria certo. E quem é que sabe? 

“Tem que amar muito a profissão, mas acho que a gastronomia te proporciona a chance de ser livre. Você pode morar em muitos lugares, porque sempre tem oportunidade. Para quem gosta de viajar, de conhecer outras culturas, é sensacional”, conta, dizendo que dá, sim, certo. 

Agora, Bianca e Rafael devem fazer o TCC e se formar, levando a experiência profissional, os aprendizados e os contatos e amigos que fizeram. Natural de Jataí, Goiás, Bianca Mahatma veio para Florianópolis em 2015, a cidade natal do pai, Beto, para estudar Gastronomia no IFSC. O nome composto foi escolha de Beto, professor de História, que chamou o outro filho de Gabriel Krishna.  

Aos 20 anos, a garota que fazia a tarde do bolo com as amigas quando criança, quer trabalhar em outros lugares e restaurantes para descobrir que área seguir. Pode ainda não conhecer seu futuro, mas de uma coisa sabe: com as mulheres do Auberge La Feniére aprendeu que sabe do que está falando. Por dois meses também foi uma mulher do La Feniére. E aprendeu que a história de tantos outros lugares ainda será marcada por mulheres. Bons exemplos, inspiradoras e que sabem do que estão falando.  

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